Hitchhiker's guide to the galaxy Imagem retirada do pinterest |
Tenho saudades de escrever em Português, de escrever longos parágrafos sobre ... saudade.
Gostaria de vos contar tudo sobre o meu último ano de vida, de como é viver num País onde o sol não nasce, aparece e desaparece como um piscar de olhos.
Falar convosco sobre as minhas aventuras com pessoas que falam completamente diferente de como escrevem. O número de erros ortográficos que dei ao tentar tirar apontamentos em reuniões foram tantos que poderia ter criado uma conta no twitter para vos partilhar um erro por dia e mesmo assim ultrapassaria o objectivo.
Que a água tornou o meu cabelo num esfregão de palha de aço, que o cabelo está a perder volume aos poucos e deito a culpa no gorro, usei-o pelo menos 300 dias em 2017; que a tinta que uso para o cabelo não fixa e que neste momento tenho o cabelo com a cor natural (preto) mas com raízes castanhas, nada bonito de se ver; que a ansiedade em fazer bem o meu trabalho teve como consequência uma maior queda de cabelo e que há uma zona da minha cabeça - 1 cm, diria - que está careca.
Que os almoços no trabalho são uma seca, que comer à secretária só me dá vontade de pegar na marmita e comer ao frio na rua (algo que já fiz n vezes), que a comida da cantina tem sempre curry, que as opções pescatarian/vegetarian são todas do género de fish and chips ou com queijo de cabra, que as caminhadas à hora de almoço são uma das minhas artimanhas para apanhar ar fresco, que muitos dos meus colegas de trabalho entram ali antes de ver a luz do dia e saem depois de anoitecer. Que o ar condicionado / aquecimento no trabalho está sempre ligado e o chão em carpete que sofre de ausência de limpeza teve o poder em transformar a minha sinusite numa inflamação 9-5.
Poderia também contar-vos de situações ridículas que presenciei, de que pela primeira vez na vida faço parte de projectos que tem budget para jantares de equipa, de como aqui o consumo de álcool é superior ao da água, e aqui não se paga água, paga-se electricidade e gás, mas água não. Que tentei um dia explicar como saborear um tinto e enquanto explicava, beberam dois copos. Que aprendi que as garrafas de vinho com rolha são escassas mas não significa que o vinho é mau. Que um dia serviram-me vinho branco sem estar frio, que já vi beberem uma garrafa de vinho mais rápido que um copo de água (já mencionei que a água para consumo doméstico não é paga?); que um dia deitaram-me vinho branco num copo acabado de sair da máquina da louça... que bebem cerveja aos litros e que na primeira sexta-feira em que saí com os meus colegas de trabalho e fomos a um pub cheguei a casa pelas 20h e já bêbeda, disse para mim mesma que nunca mais os acompanharia na bebida, saio com eles, bebo um ou dois copos e bye, have a lovely weekend.
Poderia também falar-vos de que é muito complicado encontrar peixe em posta ou inteiros na peixaria e/ou mercados, estão quase sempre à venda já em filete, o peixe é muito mais caro que lamb, só como exemplo uma dourada, sim uma dourada custa 5€ e dois pedaços de costeletas de lamb custam 3€, que os legumes são super baratos (um molho de espargos custa 1,79€ praise the lord) e que a primeira vez que vi courgettes a 0,39€ pensei que era uma promoção e comprei para congelar, mais tarde descobri que é o preço normal. Que os restaurantes são caríssimos mas mesmo assim é complicado arranjar mesa seja onde for. Que a senhora da coffee shop onde vou todas as manhãs em dia de trabalho sabe que só bebo soya or almond latte, que um americano sabe ao café da TAP (quando comecei a viajar em 1995) e que o melhor café que bebo é o da nespresso e em casa.
Gostaria de vos explicar como é andar sempre com casaco ou guarda-chuva, que em Julho fui a uma praia e estavam todos vestidos - ninguém em fato de banho - a apanhar sol. Que cometi o erro de marcar férias como se ainda vivesse em Portugal e fui em pleno Agosto para a Noruega, que não tive um único dia de praia ou com temperaturas acima dos 30º. Que o commute é longo, que passei a ouvir mais audiobooks e a ler ainda mais no kindle, que comprei apenas um livro em papel. Que dei muitos dos bens físicos que tinha mas que não consigo desfazer-me de uma peça de mobília que era da minha mãe e que é completamente inútil.
Podia contar-vos tanta coisa...
Mas não vou fazer nada disso, não vou escrever sobre as saudades que tenho de estar numa esplanada ao sol, de fazer voluntariado para a Refood, de passear com o Mr. Eko (que está bem com uma família que o adora), de ir a pé de casa ao Dim Sum, do trânsito (trânsito? que trânsito?), da piscina do Holmes Place da Defensores de Chaves, de alguns ex-colegas de trabalho, da minha casa em Lisboa, do sol.
Vou-vos contar que gosto do projecto em que estou envolvida; de que encontrei um ginásio com piscina e que voltei à Hidroginástica, ao Pilates, ao Yoga, ao Body Combat; que gosto de ir a concertos onde as pessoas não estão sempre a bater palminhas; que tenho imensos planos para o Verão e passar dias só a apanhar sol e a ler; que depois do hiato de 2017 voltei a fazer uma lista de 52 coisas a fazer num ano; que fui à Missa cá mesmo não sabendo rezar em inglês; que no Natal consegui enviar um postal de Natal para os membros mais importantes da minha família e algumas amigas; que comecei a detestar o sabor da cerveja e de alguns vinhos; que já tenho planos para todos os fins-de-semana até final de Março; que já tenho planos para a Páscoa; que recomeço a fazer voluntariado em Fevereiro; que as redes sociais que mais usei e uso são o goodreads e o instagram; que regressei ao twitter; que talvez volte a escrever mais assiduamente aqui; que continuo a ter uma relação de amor-ódio com o facebook; que assim que os dias ficarem maiores faço intenções de correr na rua ou andar de bicicleta; que apesar de tudo o que mencionei acima fui feliz e tenciono ser ainda mais feliz, e que... se o sol não vem à montanha, a montanha vai ao sol.
Feliz 2018 para os que ainda seguem este blog, com muito sol e tremoços.